quarta-feira, 7 de abril de 2010

O progresso e a felicidade, a partir de 'Stalker'

Oferecendo um contraponto poético e filosófico à exposição Energia Nuclear, inaugurada no último dia 26 de março, a sessão de abril do Ciência em Foco recebeu um público surpreendente para embarcar na jornada proposta pelo filme Stalker, de Andrei Tarkovsky. Após as quase três horas de projeção, o professor da ECO/UFRJ, Octavio Aragão - que é também escritor de ficção-científica -, conversou com o público sobre o romance dos irmãos Strugatsky - que serviu de inspiração para o filme -, e também sobre um desdobramento contemporâneo deste universo, nos games S.T.A.L.K.E.R., da companhia ucraniana GSC Game World.

À parte o papo sobre as diferenças e as peculiaridades destes diferentes formatos para a história, Aragão trouxe ao debate questões que cada um deles tratava, com especial ênfase no filme de Tarkovsky. Os aspectos misteriosos associados à 'Zona', no filme, atrelados ao cenário de desolação e decadência, evocam, à sua maneira, efeitos nocivos e desconhecidos da poluição industrial que, por sua vez, estão relacionados à busca de progresso a qualquer preço. Este foi o ponto de partida para uma reflexão sobre a ideia de progresso, questionando sua relação com a felicidade que ele poderia trazer.

Aragão partiu da crítica ao consumismo efetuada por Thorstein Veblen, no século XIX, para as atuais reflexões do antropólogo da comunicação Nestor Garcia Canclini, procurando pensar o consumo não apenas vinculado à posse de bens necessários, mas também associado à esfera do desejo, da produção de sentidos e valores que o determinam. A lógica industrial capitalista, e sua velocidade, alimentariam este processo tornando os homens cada vez mais afastados de uma felicidade mais fundamental.

Talvez inatingível, esta felicidade talvez se insinue na relação entre os três personagens do filme e na sua atenção ao tempo. Aragão tratou do modo pelo qual Tarkovsky pensava o processo de direção, descrevendo-o como uma forma singular de esculpir um bloco de tempo. Seus longos planos seriam estratégias para nos reconectar com uma pura dimensão de sensações e afetos, extraindo ou garimpando do mundo o imponderável, aquilo que não pode ser reduzido ao cálculo e à exploração.

Nossa próxima sessão acontece no dia 1º de maio, com o filme Pão e rosas, de Ken Loach. Nosso convidado será o professor José Ricardo Ramalho, professor titular do Departamento de Sociologia do IFCS/UFRJ. Aproveitando o Dia do Trabalho, sua palestra terá como tema as transformações do trabalho na perspectiva de Ken Loach. Até lá!


Um comentário:

  1. Parabéns aos organizadores do "Cineclube da Casa da Ciência" pelo evento e, em especial, ao palestrante e amigo de longa data Octavio Aragão.

    Foi uma pena não estar presente, mas imagino quão detalhada e interessante foi a análise desse importante livro dos irmãos Strugatsky.

    Vocês disponibilizarão esse material, essa conversa?

    De antemão, aproveito este espaço para convidar o professor Octavio Aragão para falar sobre esse evento em nosso podcast de Literatura Especulativa, "PodEspecular Podcast" (podespecular.com.br).

    Atenciosamente,
    Paulo Elache

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